Durante os cinco anos que trabalhei no comércio, de 1983 a 1988, me habituei
ao ritmo das reuniões mensais. Nesses encontros, eram abordados vários assuntos,
como novas diretrizes da empresa, promoções, necessidade de cumprimento de horário, prorrogação de horário
de trabalho, promoção de funcionários. Vez por outra uma ideia de um colega era
posta em prática e isso também era motivo de uma reunião, para a devida divulgação
e incentivo aos demais. Nas duas empresas que trabalhei durante esse período
essa era a regra.
Logo que comecei a luta na profissão de professor, fui trabalhar numa
tradicional escola de Fortaleza, Colégio Brasil. O diretor da escola, também
proprietário, se orgulhava em falar da gestação da escola, “como se fosse um filho”. Fazia reuniões amiúde com os professores e
funcionários. Entretanto não permitia que ninguém questionasse as regras da
instituição, assim como o andamento dos trabalhos. Certa vez um professor
propôs que alterasse não lembra que determinação. A autoridade máxima do Colégio
Brasil disse-lhe que não podia fazê-lo porque “se cada professor que entrar
nessa escola propuser algo, e eu modificar, em breve não saberei que escola
administro”. Achei bastante razoável essa colocação. Nas reuniões, apesar de
não podermos propor nada (tínhamos apenas que ouvir) não faltava nenhum
profissional até porque essas reuniões eram regiamente pagas ao fim de cada uma
delas. A escola faliu um dia por questões extraescolares.
Em outra escola, Máter Amabilis, escola pertencente a uma congregação
religiosa, as reuniões eram mais amiúdes ainda. Lá os professores não só
falavam como também eram ouvidos. E sempre havia algumas modificações no
andamento dos trabalhos. Pequenas, mas que representavam ajustes na condução do
ano letivo.
Depois vieram Christus, Farias Brito, Salesiano Dom Lustosa, Santo Tomás
de Aquino e uma infinidade de outras instituições, não necessariamente nessa
ordem, e em todas as reuniões se davam. Umas com mais discussões outras com
mais audições, mas todas contribuíam para se resolverem alguns imprevistos,
inclusive mau comportamento de alguns profissionais ou de alunos.
Veio então a escola pública. Com ela a decepção. Descobri de repente que
todo mundo manda na escola: porteiro, pca, moça ou moço da limpeza e, pasmem,
até o diretor ou diretora. Sarcasmo a
parte, quero salientar a falta de compromisso de alguns gestores da “rem
publica”. Já passei por algumas escolas do estado, e na maioria o que se vê é o
samba do crioulo doido, a desorganização é grande. Entretanto as reuniões,
eventos essenciais para se colocar a casa em ordem, existem, como símbolo de
democracia, embora o demo não tenha muita vez. Quando trabalhei no João
Nogueira Jucá, as reuniões eram realizadas para se oficializar determinações da
diretora. Se um aluno estava dando muito trabalho, por exemplo, dona Kênia,
reunia os professores, apresentava a transferência do indivíduo e assinava-se a
ata por todos. Assim ela se isentava da culpa e se protegia dos possíveis
ataques do Conselho Tutelar.
Há alguns meses postei neste blog a respeito da falta de democracia na
escola em que trabalho atualmente. Reportava-me à época ao lema da escola “Eu
faço parte”. Na ocasião chegava eu à conclusão de que não “faço parte”. Aconteceu
outro fato interessante neste ano que me ajuda a concluir que ninguém faz parte,
pelo menos nós, professores. No começo do ano letivo, numa reunião, evento
raríssimo nessa instituição pedagógica, alguns professores propusemos que se
fizesse um documento estabelecendo normas de conduta para os alunos, desde a
entrada até a saída, o qual os mesmos deveriam assinar se comprometendo com as
regras. Preocupamo-nos com isso devido à heterogeneidade de nossos clientes.
Aparentemente ficou tudo acertado. Entretanto no dia seguinte alguém da
secretaria apresentou a cada professor um código de conduta, com solicitação
para que se assinasse o documento. O feitiço virara contra o feiticeiro. Tomei
aquela medida como represália. Além de não haver reuniões, é um perigo tentar
propor algo. Não sei se os demais também entenderam assim. O documento dos
alunos não foi elaborado, e o comportamento, digo, mau comportamento por parte
do corpo discente continuou.
Um dos graves problemas que enfrentamos é com relação ao uso, digo, mau
uso do celular por parte deles e delas.
Não faz muitos dias, um aluno publicou no “facebook” a foto de outro
montado numa carteira, como se fosse a carteira o jumento. Ao fundo ainda se
via o professor tentando controlar a balbúrdia. Tenho certeza que uma pequena
reunião serviria para se tomarem, a partir desse fato, medidas contra esse
sério problema de conduta. A autoridade máxima do núcleo gestor da escola,
entretanto, resolveu ela mesma chamar, ATRAVÉS DO “FACEBOOK”, a atenção do
aluno jóquei, e ainda criticou de leve o professor “infrator”. Recentemente,
assistindo a um filme cujo nome me foge à memória, vi uma cena no mínimo
pedagógica. Nela, antes do jantar, uma mãe passa uma cesta para que os filhos,
filhas e amigos, que lá se encontram, ponham seus celulares e afins, informando
que devolveria os objetos após a refeição. Achei maravilhosa a ideia. E pensei
que seria interessante se a escola adotasse esse recurso. No início das aulas,
alguém passaria com uma cesta e recolheria os celulares, de quem os levasse, e
os devolveria ao final do turno. Mas desisti de dar essa ideia para o núcleo
gestor da nossa escola. É bem provável que a cesta passasse, mas apenas para recolher o celular dos
professores.
(Professor Alves)